Condômino antissocial - quando o problema mora ao ladoNotícia publicada no dia: 09/05/2018
Todo mundo conhece ou já ouviu falar sobre aquele morador que sempre causa transtornos, viola as regras do condomínio, não tem respeito às normas de civilidade e vive como se nada pudesse mudar seu comportamento. Provoca barulho fora de hora, convive em situação de conflito verbal ou até mesmo age de forma agressiva com os vizinhos e, de várias maneiras, desrespeita o regulamento interno ou a convenção condominial. Ele é o chamado condômino antissocial.
Segundo o artigo 1337 do Código Civil, o condômino antissocial é aquela pessoa “que não cumpre reiteradamente com seus deveres perante o condomínio” e que “por seu reiterado comportamento antissocial gera incompatibilidade de convivência com os demais condôminos ou possuidores.” Para tentar conter suas ações, o artigo define que o condomínio poderá aplicar multa de até cinco vezes o valor da taxa condominial, por decisão de ¾ dos condôminos e, caso os mesmos problemas persistam, este valor poderá chegar a dez vezes o valor da contribuição para as despesas condominiais.
O síndico de um condomínio de 12 apartamentos na região central de Juiz de Fora já não acredita que vá ficar livre dos constantes incômodos causados dentro e fora do prédio por um casal de vizinhos. “O comportamento dos dois gera grande perturbação. Eles implicam com quem passa na rua, jogam água e xingam as pessoas na calçada. Fui procurado por moradores de prédios vizinhos pedindo para que tomasse providência, já que a conduta deles ultrapassa os limites de nosso condomínio”, relata. Segundo o síndico, outro problema são as brigas conjugais que já chegaram às vias de fato.
Frequentemente ouvíamos gritos e sons de agressão contra a mulher. Boletins de ocorrência policial foram feitos, mas a vítima não assume que sofreu violência. “Consegui adverti-la de que ficar omissa a estes casos de violência doméstica também pode ser considerado crime. Preciso fazer o meu papel de cidadão consciente, além de síndico. Avisei que a Polícia Militar seria acionada da próxima vez e que o marido não teria como escapar. Desde então, as brigas parecem ter sido silenciadas”, conta o síndico que prefere não ser identificado.
Situações como esta e outras ainda mais graves precisam e devem ter solução antes que se tornem uma tragédia como a ocorrida em Belo Horizonte em 2017, na qual a síndica foi morta a facadas por uma moradora. Segundo veiculado na imprensa, moradores disseram que a vizinha acusada pelo crime fazia uso de bebida alcoólica e acabava deixando sua criança de dois anos sozinha causando comoção entre os condôminos que por sua vez acionavam a síndica pedindo providências. No dia após o Natal do ano passado, a síndica teve a morte como resposta ao seu pedido de moderação e atenção quanto às regras da convivência no condomínio.
Para a diretora do setor de condomínios da Universal Imóveis, Alessandra Ribeiro, problemas de relacionamento recorrentes com condôminos que parecem sem solução, são mais comuns do que se imagina. “O que se vê é que algumas pessoas não estão preparadas para o convívio em comunidade, onde deve-se levar em consideração o bem-estar, a segurança e a tranquilidade de todos. Muitas vezes, esses “vizinhos problemáticos” deixam de lado a empatia, pensando apenas em seu prazer e conforto,” adverte.
Solucionando o conflito com o condômino antissocial
O limiar que separa o condômino antissocial de uma pessoa capaz de agredir ou até provocar um homicídio é difícil de prever. De acordo com a sócia-diretora da ANMA – Núcleo de Ação e Mediação de Juiz de Fora, Marselha Evangelista, a busca do diálogo com o infrator é sempre o primeiro recurso a ser usado, e o síndico deve, como gestor de conflitos, estar atento ao tipo de discórdia para que possa escolher o melhor caminho para administrá-lo. A advogada relata que a mediação é um recurso interessante, pois através de suas técnicas pode-se chegar ao real motivo do problema.
Ela explica ainda que as etapas para a solução de um conflito dependem do momento em que a abordagem será feita. Na mediação, há a figura da espiral do conflito: se a espiral está muito alta a ponto das partes se agredirem fisicamente, o Poder Judiciário mostra-se como a melhor alternativa inicialmente; caso as partes estejam em condições de se comunicarem diretamente, pode haver uma mediação.
É importante ressaltar que a mediação não obsta a aplicação de multas ou penalidades, mas visa buscar uma solução sustentável que evite recorrências e desgastes no ambiente condominial. O que acontece, por vezes, é que há pessoas que mesmo sofrendo prejuízos financeiros continuam incorrigíveis, e a recorrência do conflito sempre retorna com a espiral mais elevada, trazendo novamente os problemas, sendo justamente isso o que a medição quer evitar.
Pela experiência da administradora Alessandra Ribeiro, a cobrança de multas previstas tem resolvido o problema em diversos condomínios nos quais atua. Ela relata o caso de um morador que aparentava ter problemas psicológicos e fazia uso de drogas. “Ele realizava festas até a madrugada constantemente, permitindo o acesso de pessoas estranhas ao prédio, inclusive fornecendo a senha de entrada, danificando as coisas comuns propositalmente. A saída foi a aplicação de multa com ameaça de novas punições caso o problema persistisse e uma posição firme, até que o mesmo se mudou do prédio,” conta. A administradora também ressalta que nos casos de inquilinos, um caminho é solicitar ao proprietário do imóvel que o advirta o morador sob pena de despejo por não atender às normas do condomínio (art. 23, X da Lei 8.245/91).
A legislação orienta que para haver uma punição ao condômino antissocial, devem ser também respeitados os trâmites para um procedimento regular, ou seja, advertência escrita, conduta reiterada do condômino infrator, deliberação em assembleia com quórum de 2/3 para aplicação de multa, direito de defesa do condômino infrator, deliberação em assembleia com quórum de ¾ dos condôminos para aplicação de multa de 5 a 10 vezes o valor da taxa condominial, ação judicial.
Antes de tudo, é preciso consultar a convenção condominial e regimento interno para conhecer as regras para a correta aplicação de multas e notificações, que, se não seguidas, podem dar brecha para o infrator deixar de pagar a pena e ainda entrar com ação judicial contra o condomínio.
O segundo passo é consultar a assembleia para que delibere pela multa citada no artigo. Vale dizer que o condômino tem direito de se defender e pedir anulação da multa, o que deve ser analisado também em assembleia.
Quando o caso parece ser de expulsão
É muito difícil se falar em expulsão/exclusão de morador, principalmente em se tratando de proprietário. A legislação brasileira ainda não regulamentou especificamente essa questão, porém, isso não impede que o condômino proprietário que esteja tendo um comportamento incompatível com a vida em condomínio, sofra todas as demais sanções possíveis. Verifica-se que a lei não prevê expressamente ação do condomínio contra condômino para expulsá-lo do prédio, mas se o condômino estiver causando incômodos à saúde, à segurança ou ao sossego dos demais em tal grau que lhes torne intolerável a convivência, é possível uma ação judicial contra o malfeitor.
Neste caso, “é preciso que sua infração seja grave o suficiente, sendo necessário também que seja contínua, repetida, de modo que sua reiteração provoque repulsa dos demais moradores, por perturbar-lhes a vida de tal modo que a melhor solução, para evitar mal maior, seja a expulsão do contraventor”, explica Alessandra. O síndico deve estar muito bem orientado por uma assessoria jurídica, de forma a não se envolver pessoalmente com o conflito e recolher todas as provas necessárias.
“Diante disso, cabe ao síndico conhecer todas as ferramentas que estão ao seu dispor em casos de conflitos, para se sentir seguro na hora de definir o melhor caminho a seguir”, orienta a mediadora Marselha. O principal ponto do síndico é não se omitir nessas situações, tomando uma posição firme e assertiva.
Fonte: revista O Síndico edição 25