Toneladas de recicláveis no lixoNotícia publicada no dia: 24/09/2010
Juiz de Fora produz cerca de 500 toneladas de resíduo urbano por dia. Deste total, aproximadamente 30% poderiam ser recicláveis, o que representa 150 toneladas diárias. No entanto, apenas 13 toneladas do material são destinadas à Usina de Reciclagem pelos caminhões da coleta seletiva diariamente, o que representa 8,6% do total. Mesmo somando este número com o total de duas toneladas por dia recolhido pelas duas principais associações de catadores da cidade e com o que é coletado pelos trabalhadores autônomos, a presidente da Associação Municipal de Catadores de Papel, Papelão e Materiais Reaproveitáveis de Juiz de Fora (Ascajuf), Janaína Silva, estima que ainda é muito pouco, pois cerca de 130 toneladas não estariam sendo aproveitadas ao serem descartadas com os demais detritos.
Segundo especialistas, a falta de conscientização da sociedade e de uma política municipal voltada para a questão dificulta o reaproveitamento dos materiais e o trabalho dos catadores, deixando a população em dúvida sobre como contribuir para o consumo consciente. “É difícil saber o que pode e o que não pode ser reciclado. Isso deveria ser amplamente divulgado pelo Demlurb. Outra dificuldade é entender por que o caminhão da coleta seletiva só passa em algumas ruas. Essas coisas, às vezes, nos desestimulam, pois, no dia que o catador não passa, o lixeiro leva tudo junto com o lixo normal. Mesmo assim, continuo fazendo a minha parte”, diz a aposentada Branca Pamplona, 58 anos.
A escassez de investimentos no setor também compromete o relacionamento dos catadores com a sociedade, já que a carência de estrutura faz com que muitos ocupem extensos trechos das calçadas para separar os resíduos, corram riscos em meio ao tráfego das principais vias ou durmam nas ruas para proteger carrinhos e material coletado.
O coordenador executivo da ONG Associação pelo Meio Ambiente de Juiz de Fora (AMA/JF), Theodoro Guerra, acredita que um plano concreto de gerenciamento de todos os tipos de resíduos sólidos poderia facilitar a redução de lixo e conscientização. “O Poder Público tem que estimular essas iniciativas. É claro que cada um precisa fazer a sua parte, mas as prefeituras cobram taxas dos moradores para destinar corretamente o lixo, então, precisam fazer isso de fato.” Entretanto, o coordenador do curso de engenharia sanitária e ambiental da UFJF, Homero Soares, pondera que a população precisa mudar os hábitos e ser mais participativa. “Até mesmo para cobrar dos gestores ações que viabilizem o plano, é preciso envolvimento da sociedade.”
‘Na verdade, tudo pode ser reciclado’
A presidente da ONG Instituto GEA (voltada para conscientização sobre reciclagem e capacitação de catadores), Ana Maria Domingues Luz, esclarece que, “na verdade, tudo pode ser reciclado”. Segundo ela, na dúvida, os consumidores devem separar os produtos, pois é melhor “errar pelo excesso do que descartar um material que poderia ser reaproveitado”.
Ana Maria explica que a definição dos materiais passíveis de reciclagem (ver quadro) depende do interesse dos gestores públicos e da indústria, de custo operacional e tecnologia. “Até outro dia, todo mundo acreditava que o isopor não poderia ser reciclado. Realmente a reciclagem propriamente dita ainda não é comum, mas o material já pode ser reaproveitado. Algumas indústrias já utilizam para preenchimento de almofadas e brinquedos de pelúcia. Contudo, não são todas as cidades que conseguem encaminhar o material.” A presidente da Ascajuf, Janaína Silva, confirma a informação. Segundo ela, a associação juizforana ainda não vende o material, pois precisaria de muito espaço para armazenar o isopor e de pagar um valor alto de frete para o transporte.
Segundo o diretor-geral do Demlurb, Aristóteles Faria, Juiz de Fora tem três caminhões para realizar coleta seletiva e, por enquanto, é inviável financeiramente realizar a cobertura de toda a cidade, já que isso “duplicaria os custos da coleta de lixo e poderia comprometer o trabalho dos catadores”. Janaína considera insuficiente o número de caminhões e acredita que a solução para o impasse será a contratação das associações, que está prevista na Lei 11.445. “Com o recurso garantido, as próprias cooperativas poderiam adquirir mais caminhões. Assim, mais material seria coletado, carregaríamos menos peso e poderíamos nos dedicar mais à triagem. Até será possível aumentar os tipos de materiais encaminhados, como o isopor, pois teremos como pagar o frete.”
A Lei 11.445 permite aos municípios contratar cooperativas e associações de catadores para atuação na coleta seletiva. Recentemente, Janaína Silva participou de reunião com o prefeito Custódio Mattos (PSDB) e secretários para discutir a questão. Tanto ela como o diretor do Demlurb garantem que a Prefeitura tem interesse na contratação e que, quando efetivada, trará benefícios. “Só falta acertar questões jurídicas e, talvez, no início do ano que vem, já seja realizada”, diz o diretor do Demlurb. Janaína explica que a contratação direta das associações e o repasse mensal de recursos vão possibilitar que a categoria tenha capital de giro e possa investir em estrutura e capacitação, aumentando a quantidade de material arrecadado.
Necessidade de investimento no catador
A engenheira ambiental Rosane Villanova Borges defende mais investimento nas pessoas que trabalham com recicláveis. Ela relembra que a Associação Catanorte, que reunia catadores dos bairros Milho Branco, Amazônia e Jardim Natal, na Zona Norte, foi extinta devido à falta de apoio. “Nem mesmo a isenção de IPTU foi conseguida. É difícil perceber que uma atividade que poderia dar certo, profissionalizar e garantir recursos para muitas famílias não teve condições de avançar. A questão das drogas e da violência na região também contribuiu para o fim da associação.”
Em agosto, a Fundação Banco do Brasil liberou R$ 204 mil para a construção de um galpão para catadores no Bairro Santa Tereza, Zona Sudeste. O local também vai abrigar a sede da Ascajuf e promete melhorar as condições de trabalho e reduzir o número de catadores dormindo nas ruas. O plano de construir o espaço, equipá-lo e oferecer profissionalização e segurança aos trabalhadores é fruto de parceria entre diversas instituições e a UFJF, que, por meio da Incubadora Tecnológica de Cooperativas Populares (Intecoop), desenvolve, com a ajuda de professores da enfermagem e arquitetura, um projeto sobre a qualidade de vida dos catadores. O projeto permitirá investimento de R$ 100 mil em maquinário para o galpão, carrinhos e equipamentos de proteção individual dos catadores.
Apesar dos avanços, a presidente da Ascajuf, Janaína Silva, ressalta algumas dificuldades. “Recebemos muita ajuda de empresas privadas e da universidade, mas a Prefeitura poderia nos ajudar mais. O serviço na Usina de Reciclagem é precário, principalmente por causa da falta de estrutura e do maquinário antigo. O novo galpão é uma esperança, mas a usina não será desativada, precisa continuar funcionando.” O diretor do Demlurb, Aristóteles Faria, discorda e ressalta que os equipamentos são de boa qualidade. “Sempre que há algum defeito, o Demlurb promove o conserto.”
Este mês, um incêndio destruiu parte do galpão da usina e atingiu a garra que já estava estragada. Enquanto a Ascajuf aguarda ajuda do departamento de limpeza para recuperar a garra e avaliar se houve comprometimento da estrutura, o diretor operacional do Demlurb, José Fabiano de Resende, afirma que o espaço da usina foi cedido à associação e, por isso, o órgão não teria responsabilidade de realizar manutenção. Ele explica que, por enquanto, o departamento se compromete em retirar os recicláveis danificados. “Quanto à recuperação, que é um serviço caro e demorado, será avaliado posteriormente se a Prefeitura tem condições de colaborar, mas ressalto que não é uma obrigação.”
Fonte: Tribuna de Minas