Cobrança por fração ideal ou taxa igual para todas unidades?Notícia publicada no dia: 30/08/2013
Decisão do TJMG favorável a proprietário de Belo Horizonte traz discussões sobre o assunto
Polêmica à vista no mundo condominial: recentemente, uma decisão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) pode abrir precedente para que proprietários de coberturas contribuam com a taxa de condomínio igual à dos demais condôminos, fato que vem gerando discordância entre Síndicos e condôminos em todo o país.
Segundo pudemos constatar, a cobrança de uma taxa baseada na metragem do apartamento e, portanto, mais cara para os moradores de coberturas, é vista pelo tribunal como oportunidade para um enriquecimento sem causa dos demais, podendo este até mesmo ser considerado como ilícito. Na decisão do TJMG, ficou registrado que “tal fato (ser dono de um imóvel com maior metragem), por si só não aumenta a despesa do condomínio, não confere ao proprietário maior benefício do que os demais e finalmente, a área maior não prejudica os demais condôminos”.
A questão se originou graças ao pedido de Delvayr Fernandes Aguiar (in memorian) proprietário de um apartamento com área privativa, com um jardim e um cômodo extra, em bairro nobre de Belo Horizonte. Na ação, do ano de 2003, ele pedia para pagar ao condomínio o equivalente aos demais moradores, e após dez anos de tramitação, o requerimento foi atendido. O condomínio chegou a recorrer da decisão no Superior Tribunal de Justiça (STJ), mas teve o recurso negado, o que fez com que a decisão do TJMG fosse mantida. Como o STJ não julgou o mérito nesse processo, não há, então, nenhuma “força” vinculante.
O que parece justo para alguns, pode ser considerado injusto para outros, já que o equiparamento das taxas certamente será compensado nos valores pagos pelas unidades menores, ou seja, quem pagava menos vai passar a pagar mais. Muitos consideram que, pelo fato de as coberturas ocuparem espaços que teoricamente correspondem a duas unidades e não a uma, não seria justo que a taxa condominial fosse a mesma. Porém com a recente decisão, presume-se que novas ações de proprietários de unidades maiores comecem a surgir, visando não só a economia no bolso, mas também uma valorização do imóvel no mercado, já que taxas menores para as coberturas as farão mais atrativas aos compradores.
O que diz o Código Civil a respeito
Segundo o Código Civil,o condômino deve contribuir para as despesas do condomínio na proporção de sua fração ideal, salvo disposição em contrário na convenção. E tal divisão não cabe apenas para as verbas destinadas à conservação e manutenção do edifício, mas também às designadas para obras de embelezamento, inovações e outras que sejam devidamente aprovadas em assembleia.
Consultado sobre o assunto, o advogado Rubens de Andrade Neto, diretor da Rubens Andrade Advogados, orienta que deve ser ponderada a utilização dos espaços comuns, ou seja, no seu entender, em regra geral, aqueles que detêm maior ou menor fração ideal não deveriam pagar a mais ou a menos simplesmente pela fração ideal, mas sim pela utilização efetiva dos serviços e áreas comuns, como serviços de manutenção, limpeza, elevadores, área de lazer, empregados, entre outros. “De qualquer forma, se o pagamento não for relativo à fração ideal, por força do art. 1336 do Código Civil, a estipulação deverá constar da convenção do condomínio, decidido em assembleia para tal fim. Estamos vivenciando um momento de novas decisões sobre o tema, que pugnam pela igualdade. Portanto, nossa indicação é a de que prevaleça o bom senso”, ressalta.
Ouvimos algumas pessoas e profissionais envolvidos com o assunto, confira o que estes pensam a respeito.
Rubens de Andrade Neto, diretor da Rubens Andrade Advogados
“Apesar do art. 1336 do Código Civil ser taxativo ao normatizar que o condômino deve contribuir para as despesas do condomínio na proporção das suas frações ideais, salvo disposição em contrário na convenção; a decisão abre precedentes para a discussão do princípio da igualdade, da função social do contrato, da boa – fé, e do enriquecimento ilícito dos demais condôminos, sob o fundamento de que as partes comuns são utilizadas por todos de igual forma, em determinado casos, frise-se. Caso tal entendimento se prolifere, não seria a primeira vez que o judiciário atuaria como legislador para suprir demandas reais que o formalismo da criação de leis impede. Sendo assim, no momento jurídico de mobilidade e aplicação dos princípios constitucionais, questões como essas são de grande apreciação da magistratura, uma vez que o anseio social é a criação de deveres paritários e justos.”
Aníbal Pereira, Síndico do Condomínio do Edifício Parc dês Princes no bairro São Mateus
“A meu ver, não houve alteração no Código Civil, nem na Lei do Condomínio, então o que houve foi o julgamento de um caso isolado. A forma de rateio das despesas de um condomínio é polêmica, não sendo fácil estabelecer, pois existem diversas particularidades em cada condomínio, como por exemplo a existência de piscina ou não no apartamento de cobertura, o consumo de água variando com o número de moradores de cada apartamento, e a lógica do mercado, que considera que quanto maior a residência, maior o luxo, o conforto, e a condição financeira, em tese.
Nada impede que se determine um critério diferente na convenção, desde que seja realizada uma assembleia com a aprovação da decisão por 2/3 do total dos condôminos do edifício. Uma alteração de convenção é um processo complexo que demanda reconhecimento de firma de todos os proprietários, além de registro em cartório, etc. e por isso, considero difícil tal solicitação ser aprovada.
A partir da divulgação da notícia nos jornais, muitas pessoas estão entendendo que teriam o direito adquirido com base em uma decisão isolada. Acredito estar havendo má interpretação dos fatos, conforme o próprio STJ veio a público esclarecer.
Joaquim Castilho, administrador de condomínios
“Considero que mesmo após a decisão do TJMG, deve-se cumprir a forma de rateio estabelecida pela lei maior que rege a matéria: Lei do Condomínio 4.591/64 e o Código Civil, o que só poderá ser modificado pelo Congresso Nacional.
Vale lembrar que está em tramitação o Projeto de Lei 5.035/13 do deputado Antônio Bulhões (PRB-SP) que propõe mudança na forma de cálculo do valor das taxas de condomínio de forma a que todos os moradores paguem o mesmo valor (divisão pelo número de unidades), mas esta ainda não entrou na pauta do Congresso.”
C. P. L., proprietária de uma cobertura em um condomínio no bairro Vale do Ipê
“Em meu prédio, a cobrança era pela fração ideal, porém quando saiu a decisão de Belo Horizonte, eu, proprietária de uma das quatro coberturas, decidi solicitar ao Síndico uma assembleia extraordinária para discussão do assunto.
Na assembleia, foi aprovado pela maioria dos presentes um rateio diferenciado: despesas ordinárias serão rateadas igualmente entre todas as unidades e despesas extraordinárias com base na fração ideal. Creio que a assembleia é soberana e tem poder de deliberar uma decisão. Resolvemos a questão de forma relativamente simples, pois o condomínio é formado por poucas unidades e há um bom diálogo entre os proprietários. Considero o caminho do acordo preferível ao do ajuizamento de uma ação que demanda tempo, despesas e desgastes.
Meu argumento foi o de que com critério de rateio pela fração ideal, estávamos pagando mais sem nenhum benefício extra, e acho que a decisão do TJMG dá respaldo ao meu pleito. Infelizmente em nossa sociedade é difícil encontrar pessoas com consciência cidadã, capazes de colocar um interesse maior acima dos próprios interesses.”
Fonte: Jornal O Síndico - Edição 47